Ao esquecer sua História, os povos condenam-se a repeti-la. Ensinava George Santayna sobre o retorno dos mesmos episódios na trajetória da humanidade. O atual quadro brasileiro assemelha-se a outros do passado. A República proclamada por golpe militar derrubou a Monarquia baseada no escravagismo e no latifúndio. O Império, instituído pelo príncipe colonizador Pedro I, seria obra dos ingleses. Eles a tinham em mente desde 1808. Precisavam ampliar mercados para a venda de seus produtos. A invasão napoleônica, na península ibérica, desencadeou a reação contra o absolutismo real, suscitou onda de constitucionalismo na Espanha, Portugal e colônias. As espanholas deflagraram as guerras nacionais de independência. O Brasil, efetuou a sua pelo príncipe, apresentado como defensor do liberalismo. Depois se viu, não era bem assim. Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte, prendeu os seus membros, e outorgou a Constituição Imperial de 1824, nela, inseriu-se o Poder Moderador. Tantos anos depois agora é objeto de pareceres e ações judiciais. Que Poder é esse? A Resposta inscreve-se nos artigos 98 e 99 da extinta Carta Imperial: “a divisão e harmonia dos poderes políticos é o princípio conservador dos direitos dos cidadãos e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a Constituição oferece”. Os poderes reconhecidos constitucionalmente são: legislativo, moderador, executivo e judicial. Efervescia o liberalismo centrado na cidadania. Como falar dela no regime escravocrata, com a população majoritariamente composta de cativos? Era discurso político jurídico não correspondente a prática. Por curiosidade histórica a examinaremos.
O Poder Moderador da Carta Imperial foi concebido pelo doutrinador suíço Benjamin Constant. Era o Quarto Poder, deferido ao Imperador, como representante da nação, e supremo juiz dos outros poderes, por sua condição de neutro e politicamente apartidário. O Brasil foi o laboratório da experiência moderadora, aqui exercido na pessoa de Dom Pedro II. Era a chave da organização política. A nação representava-se pela Assembleia Geral e pelo Imperador. A legitimação se fazia pelos princípios da soberania popular e da origem divina do poder monárquico. O Imperador, inviolável, não se sujeitava a qualquer responsabilização legal.
A neutralidade político-partidária, era condição ínsita ao exercício do Poder Moderador imperial. Dois partidos se reversavam na condução da política administrativa do Império. Como dizia Machado de Assis, os liberais e conservadores eram muito parecidos, exercitavam rodízio entre os mesmos.
O Exército retornou fortalecido da Guerra do Paraguai. Boa parte das tropas era formada por escravos. A corporação apoiou o abolicionismo, e os oficiais e alunos da Escola Militar liderados por Benjamin Constant Botelho de Magalhães, inspirados na ideologia positivista autoritária, protagonizaram a proclamação da República.
As intervenções militares se sucederam durante a Primeira República e as que lhe sucederam, criando-se o pressuposto de que as Forças Armadas exerceriam o Poder Moderador imperial da Constituição imperial de 1824. Impossível, por se tratar de instituição monárquica incompatível com a forma republicana de governo, conforme a manifestação de suas lideranças.
Para reforçar o argumento, é oportuno lembrar, o Presidente Castello Branco, em 1965, aprovou a Lei da Inatividade, estipulando o prazo para os generais permaneceram na ativa, e se desligarem da caserna após o desempenho de funções civis. Era a concretização do plano de profissionalização das Forças Armadas por ele defendida durante a sua carreira. Bem-sucedido. Nossas Foças Armadas democráticas, que lutaram contra o nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial, inclusive Castello, um dos seus comandantes, estão voltadas para as suas atribuições profissionais, estritamente previstas na Constituição da República.
No passado a legislação permitia a existência dos oficiais anfíbios, que exerciam cargos por longo tempo e depois retornavam a caserna. Era o caso de Góis Monteiro, Zenóbio da Costa, Cordeiro de Farias e outros.