11/07/2018

O Sonho não acabou

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Sexta-feira passada esvaiu-se o sonho do Hexa, adiado para 2022 no Oriente Médio, nas escaldantes areias do Qatar. O país recolheu as chuteiras, e agora, encarará as eleições gerais, ao meio de múltiplas crises, dentre elas, a política. O Legislativo e o Executivo desacreditados. O Judiciário, cumprindo a lei física do poder, que tem horror ao vácuo, ocupa o espaço e as funções destinados aos dois.

A preocupação dos analistas e cientistas sociais volta-se para as enquetes dos institutos de pesquisas, reveladoras do desinteresse dos entrevistados. Não querem saber de eleições e candidatos. Eles não estão no centro de suas preocupações. Em tempo de Copa do Mundo são muitas as analogias entre a política e o futebol. O resultado do jogo da sexta-feira refletiu o time do Brasil: dependente de talentos individuais, mas sem visão de conjunto, enfrentou seleção, como a Bélgica, mais bem articulada nesse sentido. O jogo, frequentemente se ganha, não por méritos próprios, mas pelos erros do adversário.

A política brasileira também sempre esteve ligada a talentos individuais. Durante o Império gravitava em torno do Imperador, após a Primeira República, centrava-se em torno de uma personalidade forte, Floriano Peixoto, Pinheiro Machado. Na Segunda, a partir 1930 avultou a figura dominante de Getúlio Vargas. Saiu de cena em 1954.  Em seguida, apareceram Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros, João Goulart, Leonel Brizola. Em 1964 instalou-se a ditadura civil-militar e os presidentes eram designados pelo sistema até 1985, quando ocorreu a transição negociada da eleição de Tancredo Neves. A Constituição de 1988 inaugura novo período, despontam nomes como Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Luís Inácio Lula da Silva.

 Nos partidos políticos emergidos posteriormente a 1988, organizaram-se condomínios, e em alguns casos, têm proprietários da organização partidária, desempenhando atribuições negociais e burocráticas, sem qualquer base de representação da sociedade.

A Constituição de 1988 dispõe que o jogo político só pode ser jogado através dos partidos, por esse caminho, a disputa seria coletiva, pois a sociedade civil estaria neles representada. Como eles carecem de representatividade, os alicerces do poder político estão combalidos. Nem eles, nem os detentores de mandatos legislativos e executivos gozam da confiança da sociedade.

Resultado, o árbitro, o Judiciário, é convocado a jogar, a sair de suas funções para conduzir-se como órgão do Poder Legislativo ou do Poder Executivo. Está configurado o impasse institucional que atravessamos. A superação da crise de legitimidade se daria com a manifestação da sociedade nas próximas eleições. Será?        Qualquer prognóstico nessa área é arriscado.

Os céticos apostam na continuação do expecto da crise, argumentam que as regras não foram alteradas, os fundos de financiamento custearão os oligarcas que impediram que se efetivasse a verdadeira reforma político-eleitoral, com o claro propósito de se perpetuarem nos cargos, mantendo os privilégios de sempre.

Os otimistas apostam no surgimento de ator individual, de jogador extraordinário, capaz de liderar a sociedade para operar as transformações exigidas pela população que começou a se manifestar nas grandes concentrações de 2013.  Os eleitores, por certo, não conseguiram até agora identificar entre os pré-candidatos à Presidência da República, o líder apto a desempenhar esse papel.

Por outro lado, forma-se consciência política clara de que sem a participação da sociedade, sem o jogo do coletivo, não haverá “craque” capaz de responder ao desafio. A Constituição Federal de 1988 dispõe de mecanismos capazes de permitir a presença da cidadania na resolução dos problemas que impedem que o Estado esteja a serviço da sociedade, e não o contrário, como hoje ocorre.

Convém que o candidato à `Presidência da República exponha a sua proposta, e ganhe a adesão ativa da sociedade brasileira. Ele poderá começar a executá-la nos primeiros dias do governo.

Na Ordem dos Advogados do Brasil, sob a inspiração do professor Fábio Konder Comparato, começamos a trabalhar nessa direção, desde a criação da Comissão de Defesa da República e da Democracia, com a finalidade de realizar os sonhos que nos moviam quando lutávamos pelo restabelecimento da Democracia, pela realização plena do Estado de Direito.

Muitos deles se realizaram, outros nem tanto. Mas se trata de processo histórico, realizável ao longo de gerações. Penso que a nossa, dentro do possível, cumpriu o seu papel. Creio que as atuais e futuras prosseguirão. Muitas etapas ainda serão cumpridas. Resta uma certeza, o sonho do Hexa, como o da construção de sociedade mais fraterna e justa, não acabou.

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