07/03/2019

Ó Abre Alas

Autor: João Batista Ericeira sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Há considerável acervo sociológico sobre o carnaval e o seu peso na explicação da cultura brasileira. É uma festa nacional, embora revista-se de peculiaridades regionais no Rio, na Bahia e em Pernambuco. No Maranhão, possui traços particulares. Até os anos oitenta do século passado, as festas carnavalescas, em São Luís, aconteciam nos clubes sociais Lítero, Cassino, Jaguarema, dos Sargentos. Os clubes populares eram bastante frequentados, com nomes sugestivos: Bigorrilho, Berimbau, Cantareira, Furna de Satã. Tanto nos sociais, quanto nos populares, davam-se os bailes de máscaras, herança do “bal masqué”, proibidos em 1965 por édito do então prefeito de São Luís, Cafeteira. Há trabalhos de pesquisa como o da professora Sandra Nascimento Souza, “Carnaval de Bailes” acentuando como eles permitiam uma certa libertação da mulher, durante o tríduo, na sociedade maranhense, patriarcal e machista. O pesquisador Ananias   Martins em “Os Carnavais de São Luís” acentua os cordões formados por personagens do carnaval europeus: dominós, pierrôs, fofões, que convergiam para o centro da cidade em corsos ou passeatas de grupos fantasiados, alguns com orquestras.

Haviam criações originais como “A Casinha da Roça”, surgida na década de quarenta do século passado, como meio interessante de demonstração da vida rural, ao som dos batuques do tambor de crioula. São Luís, em meados dos anos setenta, com a construção das pontes sobre os rios Anil e Bacanga sofreu uma enorme transformação urbana, de uma população de 250 mil habitantes em 1970 passou a ter 825 mil habitantes em 1995. Novos bairros surgiram, de classe média, São Francisco, Renascença. Mais periféricos, Anjo da Guarda, Sá Viana, Vila Embratel.

A que se acrescentaram os da Ponta D’Areia, Olho D’Agua, Calhau, também de classe média alta. A expansão demográfica e urbana alterou as componentes do “Carnaval da Ilha”, dividido em três zonas: das escolas de sambas, de inspiração carioca, que desfilam na Passarela; o da Litorânea, dos trios elétricos, de matriz baiana; e o circuito da Madre Deus, ambicionando a preservação das melhores tradições do carnaval puramente maranhense.

Atualmente o carnaval de rua ganha novo fôlego, com a reunião de jovens foliões organizados em grupos, com orquestras, revivendo os carnavais do passado, em clima familiar de harmonia. A nossa festa, ao contrário de muitos países, não é local, é nacional. Alguns sociólogos, como Roberto Da Matta, desenvolveram estudos antropológicos, a exemplo do livro “Carnavais, Malandros e Heróis”, de 1979, para explicar a relevância da festa na compreensão do Brasil. Onde durante três dias se promove a igualdade por meio da folia, em uma sociedade desigual e dividida em castas. Não importa que tenha se originado na Índia, na Grécia ou em Roma. Ele aqui desembarcou e adquiriu características próprias. É a maior festa do país. Entranhou-se na alma do povo. Todos os governantes são obrigados a submeterem-se a Momo, qualquer que seja a sua inclinação política- ideológica.

Na história do carnaval destaca-se uma exponencial figura de mulher, a maestrina, compositora, pianista Chiquinha Gonzaga. Lutou contra o preconceito, o escravagismo, compôs a primeira música para o carnaval, “Ó Abre Alas” para animar o cordão Rosa de Ouro, do Andaraí no Rio, em 1899.

No Maranhão, Maria Firmina dos Reis, escreveu o romance “Úrsula”, o primeiro libelo acusatório contra a escravidão.  A primeira mulher aprovada em concurso para o cargo de professora primária. Brava lutadora contra os preconceitos e escravidões.

Outra maranhense notável, a poetisa Laura Rosa. Escritora, jornalista, insurgiu-se contra as limitações de uma sociedade patriarcal, foi a primeira mulher a ingressar na Academia Maranhense de Letras.

Abramos alas para elas. As três eram mulatas, filhas do povo brasileiro. Devem ser lembradas sempre, antes, durante e depois dos carnavais.

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