09/12/2019

Nossa América Latina

Autor: João Batista Ericeira sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

A Câmara dos Deputados do Chile aprovou lei reduzindo em 50% os salários dos seus parlamentares. Tomou-se a medida no meio da crise atravessada pelo país com manifestações de rua, reprimidas com gás e balas de borracha, causando danos nos manifestantes, em alguns casos, gerando a invalidez por cegueira. A situação chilena não é a única no continente. Os tumultos se repetem no Peru, Equador, Bolívia, Colômbia, Venezuela, todos vivendo momentos de impasse para os governos, e até de destituição, a exemplo da Bolívia, e mesmo do Brasil, com o impedimento de Dilma Rousseff.

As manifestações de rua nas cidades brasileiras em 2013, não foram percebidas pela classe política. Esta não procedeu as reformas reclamadas pela população. Naqueles dias os movimentos organizados repeliram os partidos e políticos tradicionais.

Logo os analistas cuidam de buscar as causas das convulsões na região. A Comissão Econômica para a América Latina e Caribe-CEPAL lembrou em recente informe que o número de pobres na região deve alcançar a 191 milhões de pessoas no final deste ano. Aumentou em 6 milhões do ano passado para cá. Avolumou-se a concentração da riqueza e a desigualdade. Os ricos ficaram mais ricos e os pobres mais pobres.

A receita da CEPAL é conhecida: o alargamento do Estado do bem-estar social, ampliando direitos e a correspondente proteção social, com acesso universal aos serviços qualitativos de educação e saúde. Alguns governos comprometeram-se com essa agenda. Exemplo, a Bolívia chefiada por Evo Morales, responsável por surto de crescimento econômico, promoveu inclusão e igualdade. No entanto, Morales, alvo de ruidosas manifestações, obrigou-se a renunciar ao governo.

O Uruguai, após quinze de governos da Frente Ampla, um deles liderado pela emblemática figura de Pepe Mujica, teve que ceder o lugar, para Luís Alberto Lacalle Pou, do Partido Nacional, do espectro centro-direitista. Trata-se de um país com bons índice educacionais e de elevada tradição política, facilitando o processo de transição, procedendo-se de forma civilizada e dialogada. O que não se dá na Bolívia com a história recheada de intervenções golpistas, sem passado consolidado de formação política.

Dois pesquisadores, os economistas Daniela Campello e Cesar Zucco, da Fundação Getúlio Vargas, apresentaram recente trabalho em que pretendem demonstrar: a atual agonia dos países da América do Sul,  atingindo o coração de seus sistemas políticos, se deve a queda nos produtos que integram a pauta das commodities :  os agropecuários e os minérios, provocando o  declínio do seu crescimento econômico, e por via de consequência, gerando a instabilidade política, face a impossibilidade de os governos da região prosseguirem os projetos de inclusão social, incluindo-se também a taxa de corrupção.

Mas a guinada eleitoral na maioria dos países foi para a centro-direita, à exceção da Argentina e do México. A opção tradicionalmente é considerada restritiva de direitos sociais. Como se explica?  Na Bolívia, especificamente, o ex-presidente Morales desejava mais um mandato, já cumpria o terceiro, desconsiderando o plebiscito anterior que rejeitara o quarto mandato.

Salvo melhor juízo, apesar dos riscos do populismo, de uma vertente ou de outra, há, inegavelmente, maior conscientização em favor da democracia como regime político, e um dos seus postulados básicos é a alternância no poder. Não se admite mais que os mesmos se eternizem nos cargos de direção. Não é salutar para o Estado nem para os cidadãos.

É bom frisar, a política e o Direito não são epifenômenos da economia, ambos têm a sua autonomia, mesmo guardando estreitas relações de interinfluências. No Direito, convém ressaltar o disposto no parágrafo único do artigo 4º da Constituição Federal: devemos buscar a integração com os países da América Latina, respeitando claro, a autodeterminação de cada um.  

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