03/09/2018

Brasil, arcaico e moderno

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

A Semana da Pátria que culmina com o dia da Independência, 7 de setembro, propicia reflexões sobre os destinos do Brasil. País envolvido em contradições desde a origem de sua emancipação política, realizada por um grupo de ilustrados, vinculados à Maçonaria, reunindo o pensamento mais avançado daquele tempo, liderado por José Bonifácio de Andrada e Silva, cognominado de o “Patriarca da Independência “. Todos eles ligados à Dinastia Bragança, que reinava em Portugal, ardorosa defensora do absolutismo, ancorado no Direito divino de governar. Boa parte deles, inclusive os irmãos de José Bonifácio, Antônio Carlos e Martim Francisco, conhecidos como o “Andradas”, exerciam cargos na administração pública portuguesa.

A independência do Brasil, ao contrário dos países da América espanhola, se efetivou pelo próprio colonizador, Dom Pedro I, auxiliado por funcionários brasileiros do governo português. Defensores da tese de que o poder político emana do povo, e em seu nome é exercido. Conforme o ideário da Revolução Francesa e dos seus postulados:  liberdade, igualdade, e fraternidade, em contradição com o Direito divino de governar, sustentado pelos monarcas portugueses.

Naquele contexto histórico, a convergência de interesses da Dinastia Bragança, da Inglaterra, sua protetora, e da elite de funcionários brasileiros do Estado português, permitiu o Grito do Ipiranga, tornando o Brasil politicamente independente, mas totalmente dependente financeiramente, por conta da indenização devida a Portugal e aos empréstimos contraídos junto aos ingleses.

A nação brasileira não existia, sua construção e manutenção da integridade territorial do país foi obra do Segundo Império, conduzido pelo herdeiro da família Bragança, Dom Pedro II. O Estado veio antes da existência da nação ou da sociedade civil.

O Estado gerado pela elite patrimonialista luso-brasileira, intransigente defensora de suas vantagens e privilégios. Os manteve preservados após vários ciclos republicanos. Em 1922, intelectuais de vanguarda abriram a Semana de Arte Moderna, para mostrar o atraso em que nos encontrávamos no plano intelectual, nas ciências e nas artes. Comemorava-se o centenário da Independência. No campo da política, as oligarquias sustentavam seus cargos e rendimentos, enquanto começavam as insurreições castrenses, da juventude das escolas militares, sequiosa de mudanças em um panorama que permanecia imutável.   

Em 2022 estaremos comemorando o bicentenário da Independência convivendo com os mesmos problemas: a elite política predatória, a desigualdade social vergonhosa. Os indicadores em saúde, educação, e segurança são iguais aos países mais atrasados da África e da Ásia. Elevada mesmo é a carga tributária, semelhante à dos países nórdicos, Suécia, Noruega.

A primeira Constituição do país politicamente independente, a de 1824, outorgada pelo Imperador Pedro I, após a dissolução da Assembleia Constituinte, trazia em seu corpo a retórica liberal, contemplava as suas melhorias conquistas, contradizendo com o regime escravagista vigente no país. A abolição, defendida por José Bonifácio, só se tornou possível em 1888.

Desde o início convivem no Brasil o arcaico e o moderno. Há setores da economia de alta modernidade, como a indústria aeronáutica, de comunicações, de exploração petrolífera, ao lado do arcaísmo da falta de saneamento básico; de serviços de fornecimento de água e esgoto para a maioria da população. De escola de boa qualidade, de serviços de saúde atendendo as exigências básicas da população; carecendo de segurança, e de transporte público compatível com as necessidades dos centros urbanos e da zona rural.

A Constituição de 1988, moderna, protetora do meio ambiente, das minorias, dos velhos, das crianças e adolescentes, tuteladora dos Direitos Sociais, dispõe de retórica não condizente com os níveis de exclusão que testemunhamos, inclusive do não-acesso à Justiça Pública.

A informatização da Justiça Eleitoral é de fazer inveja aos países mais desenvolvidos do mundo. O modo de coletar os votos e de apurá-los tem eficiência comprovada, ao lado disso, a forma de exercer a política é a parecida com a que se praticava duzentos anos atrás. A representação política é viciada e não comprometida com os reais interesses da sociedade.

Alguns setores da economia são modernos, mas a política persiste em ser arcaica, na repetição dos mesmos erros. Nas eleições para a Presidência da República, corre-se o risco da reedição do sebastianismo, da crença de que o “Homem Providencial” trará a solução para todos os problemas. Trata-se de crença enganosa como comprova a história recente com as eleições de Jânio Quadros e Collor de Melo. As mudanças ocorrerão a partir da sociedade e da sua verdadeira representação política.

O último exemplo é o do nosso Direito, moderno na teoria, mas arcaico na prática.

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