22/10/2019

As Vozes das Ruas

Autor: João Batista Ericeira sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Em junho de 2013 grande onda de manifestações populares ocupou as principais cidades brasileiras. Protestavam contra a inoperância dos serviços públicos, a corrupção, as dificuldades de mobilidade urbana. Nessas manifestações os cabeças dos movimentos não permitiram a participação de partidos políticos e suas bandeiras. As lideranças partidárias não decodificaram os sinais manifestos de descontentamento da população para com siglas partidárias e suas lideranças.

Em 17 de setembro de 2014, sustentei em artigo a imediata necessidade de reformulação do Direito político e eleitoral. Como se aproximavam as eleições gerais de outubro, quando haveria a renovação dos cargos Executivos da União, estados, e Congresso Nacional, sugeri que caberia a próxima legislatura, a tarefa de executar a Reforma Política, propugnando a sua inserção como tema de campanha. Entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil-OAB, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB e o Movimento Contra a Corrupção Eleitoral, firmaram a mesma posição.

As lideranças partidárias permaneceram surdas às vozes das ruas. O resultado, dentre outras causas, foi o impeachment da Presidente Dilma Rousseff; a ascensão de Michel Temer; e a eleição do atual Presidente da República, Jair Bolsonaro. Este utilizando-se das redes sociais e do desprezo da população aos partidos políticos, elegeu-se em pleito atípico, em que os partidos políticos, as redes de televisão e os marqueteiros não tiveram vez.

O sistema eleitoral em vigor exige a filiação em partido político para a disputa de cargos eletivos do Executivo e do Legislativo. A exigência visa fortalecer a organização partidária, comprometida com princípios e programas, como representante da sociedade nos órgãos do Estado.

Apesar da exigência preconizada em preceito constitucional, estamos cansados de saber, os partidos políticos não lograram se firmar no Brasil como veículos de representação política da sociedade. A disfunção possui raízes históricas, origina-se na Independência Política, perdura na Monarquia, e continua na República. Ao contrário da Argentina, Uruguai, Peru, que desenvolveram organizações partidárias centenárias. O agravamento da crise de legitimidade dos partidos agrava-se com as inovações tecnológicas, possibilitando a participação direta do eleitor. Nesse sentido, a situação universaliza-se a todos os países influenciados pela Constituição alemã de Weimar de 1919, instauradora da democracia partidária no Ocidente contemporâneo.

Os partidos políticos estão mergulhados em crise de representação, na última eleição presidencial, o candidato eleito utilizou-se do que se convencionou chamar de “legenda de aluguel” e ganhou o pleito sem qualquer compromisso partidário e programático. No passado não foi diferente nas eleições de Vargas, Jânio, Collor, todos, sem nenhuma vinculação orgânica a um partido político.

A Constituição e a legislação infraconstitucional exigem a filiação para os candidatos, com as consequências decorrentes, o acesso ao fundo partidário e ao eleitoral. O partido em que se elegeu o atual Presidente da República, turbinou-se com a sua chegada à suprema magistratura, dispondo de somas elevadas do dinheiro do fundo partidário e do eleitoral, explicando-se assim, a disputa do seu controle entre os seus seguidores e opositores. Tema que deverá ser enfrentado pela Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal.

A digressão decorre da recente discussão sobre a conveniência da candidatura avulsa para os cargos eletivos. Manifestei-me na última reunião do Conselho Federal da OAB. Primeiro pela inconveniência de deixar o tema para a decisão judicial. Trata-se de matéria da estrita competência do Poder Legislativo, que deve apreciá-lo no bojo de uma Reforma Política, que infelizmente continua tardando. Se formos olhar o passado das eleições presidenciais, constataremos que as candidaturas eram isoladas e os partidos políticos meramente simbólicos. Não será a candidatura avulsa que enfraquecerá os partidos, estes devem se atualizar, modernizar, para representarem a sociedade, mas acima de tudo, precisam ouvir as vozes das ruas.

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