09/11/2020

A Democracia Americana

Autor: João Batista Ericeira sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Há anos as mudanças demográficas alteram a política norte-americana, considerada o melhor exemplo da Democracia mundial. No século 19, o francês Alexis de Tocqueville, após viagem aos Estados Unidos, publicou o livro “A Democracia na América”. Elogiou o modelo ianque e as instituições intermediarias daquela sociedade, concluindo que o êxito final dependeria da compatibilização dos direitos individuais, as liberdades, com os direitos sociais, a igualdade. Esta última vem minguando ultimamente pela excessiva concentração da renda, e a impossibilidade dos imigrantes, latino-americanos, africanos, asiáticos, atingirem o “american dream”, o sonho americano de ingressarem na classe média, com uma boa casa, automóveis e os filhos em boas universidades, ocupando os melhores postos de trabalho. O maior contingente é oriundo dos países pobres, do chamado Terceiro Mundo, que ao lado dos afrodescendentes, constituem a massa dos despossuídos. São predominantemente jovens eleitores. Eles votaram em Barack Obama, e agora, em Kamala Harris, eleita a vice-presidente de Joe Biden, determinante para a sua eleição, por ser uma afro-asiática.

Os avanços sociais se operam através do “american way life”, isto é, sempre individualmente. Claro, aprofundando as conquistas dos Direitos Civis, das igualdades legislativas, obtidas nos governos Kennedy e Johnson, impulsionados pelas marchas do pastor Martin Luther King, nos anos sessenta do século passado. Apesar disso, persiste o racismo sistêmico, comprovado pelas recentes mortes de negros, assassinados por policiais brancos, desencadeando o movimento “Vidas Negras Importam”, que em muito contribuiu para a derrota eleitoral do atual presidente, ao lado da negação da pandemia. Esta última reduziu o ritmo do crescimento econômico.

O presidente em exercício acusa a existência de fraudes e promete judicializar as eleições. Terá êxito no propósito? Não creio. Lá, inexiste Justiça Eleitoral. As eleições ficam a cargo dos cidadãos, que votam facultativamente, e se encarregam voluntariamente das apurações. Nunca se comprovou a existência de fraudes estruturais ao longo de pleitos seculares.  Ademais, o Judiciário, por tradição e experiência, não se colocará contra a vontade da cidadania.

O eleito Joe Biden, é um político tradicional, representativo do “americano médio”, escolhido pela máquina do Partido Democrata como o mais apto a derrotar o empresário Donald Trump. Que não é historicamente membro do Partido Republicano, mas dele se aproveitou para eleger-se com retórica nacionalista, populista, atingindo os desempregados da indústria automobilística e os temerosos do discurso tido como socialista de Bernie Sanders.

A democracia americana é perfeita? Não.  A democracia é um sistema imperfeito, sempre em construção. Seja americano, francês, alemão, sueco, inglês, como bem afirmou Winston Churchill após liderar a Inglaterra contra o totalitarismo nazifascista na Segunda Guerra Mundial. Utilizando o habitual senso de humor britânico, grafou a conhecida frase: a democracia é o pior regime político à exceção dos outros. Significa dizer, com os seus defeitos não existe outro melhor.

Os Estados Unidos emergiram após a Segunda Guerra Mundial, como a grande potência, o lugar de realização dos sonhos de felicidade material e espiritual dos imigrantes de todos os lugares do mundo. Os anglo-saxões e protestantes tiveram maiores oportunidades nas conquistas econômicas e políticas em detrimento de italianos, irlandeses, polacos. Mas estas nacionalidades aos poucos foram atingindo elevados postos na atividade empresarial e política. John Kennedy, de ascendência irlandesa, foi o primeiro católico a ocupar a Presidência da República, seguido agora de Joe Biden, também de fé católica e avós irlandeses. Mas o tratamento dispensado aos afrodescendentes, havidos como cidadãos de segunda classe, fere fundamentalmente o ideal de igualdade, contamina a democracia do país, ao lado do peso poder econômico no resultado das eleições. Devemos reconhecer, a conciliação da liberdade individual com a igualdade social continua a ser buscada pela democracia americana. Cuidemos da nossa.

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